sexta-feira, 11 de maio de 2007

Falar sem palavras


Alguém falou da tristeza e do vazio do olhar dos animais.
Vi a tristeza, em certos momentos, no olhar do cão.
A tristeza de quem quer chegar à palavra e não consegue.
Mas não vi o vazio. O vazio está talvez nos nossos olhos.
quando por vezes nos perdemos dentro de nós mesmos.
Ou quando buscamos um sentido e não achamos.
O cão sabia o sentido, o seu sentido. E nunca se perdia.
(...)


Era verdade. Durante uns dias o cão não falou. Digo bem:
não falou. A fala é muito complicada. Está antes da palavra,
como a poesia. E aquele cão falava. Falava com os seus vários
modos de silêncio, falava com o andar, com as inclinações
da cabeça, com o levantar ou baixar as orelhas. Daquela vez
calou-se por completo. Não falou com nenhum dos seus sinais.
Nem sequer com o seu silêncio.

Alegre, Manuel, Cão Como Nós, Dom Quixote